sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Faixa 44 (cruzes credo II)

Ele há coisas do diabo – não o chifrudo em si, só a apenas a imagem da coisa – andava eu atrás de algumas coisas que me têm escapado no universo musical quando um amigo americano me deu uma dica: “Sabias que anda tudo doido por cá por causa do último trabalho dos Megadeth? Tens de o ouvir!”, em anexo lá vinha um mp3 com uma faixa que, aos primeiros acordes parecia ser algo de conhecido, e no fundo era, A tout le monde - uma das faixas épicas da banda tinha sido recriada pela loucura de Dave Mustaine e pela voz quase angelical de Cristina Scabbia, uma italiana que dá voz desde 1994 aos Lacuna Coil. Foi preciso dar mais algumas voltas para perceber a extensão do problema americano do momento. O último trabalho destes senhores chama-se United Abominations, uma crítica e um ataque feroz desferido às United Nations e, para que não restassem dúvidas, a capa do disco mostra o edifício da ONU em Nova Iorque a ser atacado e destruído. Na habitual paranóia norte-americana a imagem é entendida como uma óbvia mensagem terrorista, um incitamento à violência. Até pode ser, as letras deste disco são de facto um ataque sem quartel às inconsistências da ONU, aos jogos de bastidores e à forma declarada como tem fechado os olhos às atrocidades cometidas pelos americanos.
É óbvio que uma coisa assim só podia trazer problemas aos Megadeth mas numa nação onde as simulações de afogamento são permitidas para interrogatório de prisioneiros; Guantanamo está logo ali ao lado; onde o facto de nunca ter existido a verdadeira e declarada razão para invadir o Iraque é rapidamente esquecida; onde as imagens da capa de um disco são alvo de preocupação mas por outro lado a difusão consentida de imagens do enforcamento de Saddam é tratada como um pequeno acidente onde os culpados, imagine-se, até são iraquianos; onde a maioria da população trabalha sem ter sequer o direito aos cuidados de saúde e onde uma eleição presidencial não é mais do que uma enorme angariação de fundos e de promessas de negócio feitas pelos futuros vencedores aos seus maiores e melhores apoiantes – leia-se quase toda a nata da economia americana -, com que direito podem criticar o que quer que seja?
Os Estados Unidos da América são um bom exemplo de algo que, em geral, rapidamente esquecemos. Muitas das coisas feitas por esse país nos últimos anos são dignas da mão e comando de uma outra figura histórica que, opinião minha - e de alguns cartoonistas espalhados pelo mundo -, se fosse americano, estaríamos bem tramados outra vez, um tal de Adolfo, lembram-se dele?


Cover: Megadeth - United Abominations, Maio de 2007

P.S. – Estranhamente, só cerca de nove meses depois do lançamento, alguém algures numa qualquer cadeira de uma sala enfiada no 30º andar de uma qualquer cidade, se chateou com o disco em questão. Presumo que tal como eu, alguém estivesse a dormir…

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